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Mostrando postagens de dezembro, 2008

Lavem as manchas do mundo

Lembra quando postei uma reportagem sobre os artesãos de Santana do São Francisco ? Lembra que eu disse que fomos para a antiga Carrapicho eu, o jornalista Anderson Ribeiro e o cinegrafista e editor de imagens Genisson Silva, munidos de uma câmera condenada e um microfone comum? Lembra que eu disse que, ainda assim, trouxemos na bagagem um especial de 30 minutos e duas reportagens? Pois bem. Eis a segunda reportagem: Tá bom, tá bom. Eu admito que o microfone apareceu umas duas ou três vezes. Mas não foi você que ficou durante um bom tempo em cima de uma pedra, num sol de rachar, de braço teso e esticado, segurando o fio de um microfone comum. OU VOCÊ PENSOU QUE TUDO ISSO FOI FEITO COM MEGAESTRUTURA DE NOVELA?

O Piano

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Notas e tons, jobinando as canções pra você Solta um bemol, gargalhadas em lá Esse piano, instrumentando a nossa ilusão Teclas e sonho, arremedos nos dedos das mãos A mão entende o que o meu coração quer dizer E quando se estende, procura você E esse piano, extensão dos meus braços, remir Alcança o sol para lhe oferecer O primeiro dó O primeiro amor Paixão sustenida, razão diminuta E a clave arrebenta em mi São tantas oitavas Mas todo piano Termina em si. Música em parceria com Anderson Ribeiro e Gilton Lobo.

Adoção em pauta

Os cinco posts a seguir são uma reportagem especial que publiquei no Jornal Cinform desta semana. Espero que alguém consiga ler até o final.

Mito e preconceito: cárcere da adoção

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Amor de Aderval deu sentido à vida da pequena Camila “Com tanta criança saudável, o senhor vai levar logo essa doentinha?”. Cara a cara com o absurdo, o bioquímico Aderval Nunes pasma por um instante. Engole seco, recompõe-se, segue em frente. Decidido, não seria o preconceito, impregnado nas próprias instituições de proteção a crianças e adolescentes e que, naquele momento, alastrava-se na voz e no inconsciente da funcionária de um abrigo, que o demoveria do sonho de ter a pequena Camila, 6 anos, como sua filha. Com uma deficiência mental moderada, ela encontrou em Aderval e na sua esposa, a contabilista Maria Luíza Santana, uma família e um estímulo para voltar a andar e falar.  Hoje, um ano e oito meses após a adoção, médicos estimam 90% de chances de recuperação. “Procurei pensar no bem-estar da criança e no amor que eu sentiria por ela, e que também é recíproco, sem me preocupar que fosse igual a nós. Camila é negra, mas isso não nos incomoda. Ela uniu a família, é supercarinho

Espectro do abandono, infância de incertezas

O administrador de empresas Antônio Matos (nome fictício), 29 anos, viveu a infância como um malabarista amador, a manejar desastradamente suas angústias, dúvidas e mágoas. Quem era o seu pai? Onde estava? Por que não o procurava? Perguntas sem resposta exerciam o peso de malabares de chumbo na cabeça do menino do município de Serrinha, na Bahia.  Filho de uma dona de casa e de um empresário bem-sucedido, aos 19 anos Antônio até sabia o nome de seu progenitor, mas jamais o havia visto. “Sempre tive curiosidade de saber quem ele era. Só me faltava coragem de perguntar, porque eu também não queria constranger a minha mãe, fazê-la relembrar um passado que talvez não quisesse. Mas os meus familiares não aceitavam que eu vivesse naquela situação, com a identidade sem o nome do pai, e passaram a me dizer que eu merecia saber. Minhas tias o procuraram e a gente começou a se aproximar”, rememora Antônio.  A reaproximação entre filho e pai biológico aconteceu mediante exigência de teste de DNA.

“A saudade é o revés de um parto”

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Professor remói saudade, mas reluta em adotar um filho Jéssica nasceu com problemas congênitos. Frágil, lutou contra a infecção hospitalar, pneumonia, meningite, entre outras enfermidades. Começou a andar aos 5 anos e perdeu a vida aos 7, no colo da mãe, vítima de uma crise asmática, a caminho de um hospital. Hoje, uma década após a sua morte, a perda ainda dói latejada no peito da dona de casa Juliana Santos, 36 anos, e do seu marido, o professor Francisco, 54 (tanto o nome da criança quanto os dos pais são fictícios). Todo dia, a mãe prepara o quarto da sua pequena como se a esperasse voltar – cama, impecavelmente arrumada, fotos dispostas nas prateleiras, bonecas caprichosamente vestidas e penteadas. Juliana e Francisco materializam a saudade que é, de fato, “arrumar o quarto do filho que já morreu”.  Casados há 17 anos, eles mantêm o quarto intacto enquanto lutam para ter um novo bebê. Ligados pelos traços consangüíneos, os primos Jul

Amor à décima potência

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Kael e Carla: irmãos unidos pela adoção Quem duvida do amor entre pais e filhos adotivos certamente não conhece a secretária executiva Carla Batista Conceição. Aos 15 dias de vida, ela foi adotada por Maria Alice Conceição, uma assistente social que enfrentou o preconceito – muito mais arraigado há 32 anos – e, mãe solteira, criou três crianças e construiu uma família que ainda hoje, 12 anos após a sua morte por infarto, permanece sólida.  “A minha mãe biológica não tinha condições de me criar. Morava no interior da Bahia, era muito jovem, tinha problemas de saúde e não era casada. A minha tia trabalhava no hospital onde eu nasci e chegou em casa dizendo que uma menina ficaria para adoção. Foi aí que minha mãe me adotou”, revela Carla. Depois dela, Maria Alice ainda adotaria Carlos Eduardo, aos 3 meses de vida – hoje com 23 anos –, e o caçula Kael, com apenas um dia de nascido – e agora um adolescente de 13.  “Eu nunca tive problema por ser adotada. N

Destituição do poder familiar: dilema da justiça

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Luiz Schettini, sobre abrigos: “a criança vai ficando indefinidamente ali” O Cadastro Nacional de Adoção é um grande passo da justiça brasileira no sentido de democratizar e desburocratizar os processos de adoção. Faz uma integração das listas de crianças que podem ser adotadas e dos candidatos a pais registrados nas varas da infância e da juventude de todo o país. Possibilita, por exemplo, que um casal do Rio Grande do Sul encontre no Maranhão uma criança com o perfil desejado. Mesmo com tantos avanços, o principal dilema da justiça permanece: a maioria dos pequenos abrigados ainda mantém vínculos jurídicos com familiares de origem, que muitas vezes sequer comparecem às audiências.  Como definir, então, o momento exato de destituir um pai ou mãe biológicos do pátrio poder ou poder de família? Como desgarrar essas crianças e dar a elas uma chance de viver fora dos abrigos? “Muitas dessas crianças não estão disponíveis para adoção porque o juiz não r