Cidade de barro, jornalismo concreto
Sabe aquela altivez de quem faz uma boa comida a partir das sobras? De quem vence o prêmio da Fórmula 1 na munheca, sem estar a bordo de uma McLaren ou uma Ferrari? Pois então, acrescente a esse orgulho sem tamanho uma sensação de liberdade criativa e você já sabe o que é fazer TV pública.
Nada de ‘chefs’ se vangloriando pelo banquete com tempero pronto. Nada de Playmobil formatado para os mesmos movimentos. Nada de raciocínio padrão. Na corrida da TV pública não há amarras, amigo. O piloto ainda vale bem mais do que a máquina.
E por falar em piloto, lá fomos eu, o jornalista Anderson Ribeiro e o editor de imagens Genisson Silva para Santana do São Francisco, a antiga ‘Carrapicho’, capital brasileira do artesanato. Uma cidade que vive do barro e cheia de histórias para contar.
Partimos com a cara, a coragem, com a grana do próprio bolso – as diárias só foram liberadas após a viagem – e com uma tal de ‘PD’, a pior câmera da redação, condenada por nossos cinegrafistas. Coisa de quem acredita na pauta.
Nem entrevistado, nem horário, nem local específico. Nada agendado. Eu e o Ribeiro, atuais editores de texto da televisão, saímos para rememorar os tempos de repórter. De vez em quando é bom esticar as pernas, fazer o sangue circular. Genisson, o popular “Cabeção” ou “Lápis com Borracha”, doido para mostrar o seu talento de cinegrafista – até então, jamais havia saído da ilha de edição, pelo menos, nesta emissora.
“Você está indo sem a minha autorização”, bradou o chefe do Genisson, temeroso. Ele temia, mas nós não. Parecíamos antever o resultado: duas reportagens especiais, a primeira sobre os artesãos de Carrapicho – que está gerando um programa piloto de reportagem de meia-hora – e a segunda, ainda a ser editada, sobre lavadeiras. E o mais legal de tudo é que não tem repórter passado e engomado, nem qualquer voz didática explicando o que acontece em Santana do São Francisco. Para nós, a história contada por aqueles que a fazem vale muito mais. É o tal jornalismo sem maquiagem.
Por hora, compilamos o material sobre o trabalho com o barro para a TV Brasil e que exibo logo aí abaixo. Pena não termos tido condições de usar o boom, aquele microfone que capta o som ambiente sem precisar ninguém cansar o braço ou borrar cenários com os tradicionais microfones ‘picolés’. Éramos eu, Anderson, Genisson e a pior câmera da emissora. Ainda assim, gostei muito do resultado.
Comentários
que legal, Álvaro! esses são os maiores problemas da linguagem jornalística da TV: repórter engomado dizendo a verdade, e voz em off de repórter impondo significado àquelas imagens e pessoas com suas próprias histórias.
essa reportagem parece ter um q de documentário. tô curiosa pra ver.
abraço!
a luta e a recompensa dos trabalhadores humildes. (JPPM)
não queria dizer não pra não encher sua bola - pq a cada post seu e a cada trabalho que cê faz, o povo fica babando horrores (ok, cê merece, mas vamos manerar pq se não a humilde vai correr léguas) -, mas sinceramente, cada dia aprendo mais com as coisas que eu vejo dentro da tv. fico até com medo de qnd sair de lá, o que pode acontecer comigo e essa "liberdade de criar" que dão oportunidade da gente ter. e vc, tem sido não só um professor, mas um cara que eu aprendo a admirar cada dia. admiraria mais se vc ainda tivesse pança. mas, ng é perfeito. hahaha!
:*
:~
Falando em jornalismo eu tive aula de telejornalismo na universidade e (o) a professor (a) seguia um tal de padrão globo que não (pelo menos pra o educador (a) em questão) permite o reporter ser criativo, o que é uma pena. Então assistimos a trabalhos assim como este seu, com poucos recursos, mas extremamente rico em conteúdo e ficamos felizes de acreditar que um outro jornalismo é possível! Parabéns.