Por quem os sinos dobram?
“Se você acha que o seu salário é baixo, que tal ela?”
Ao ver este tal “e-mail do ano” tantas vezes passado e repassado por gente, carne, osso e sentimentos como eu, a humanidade que ainda me pesa arde em repulsa, incinera-se em vergonha.
Hipócritas! A criança que nos estende a mão neste “e-mail do ano” não é a mesma que nos abre a pequenina palma nas esquinas, nos semáforos das nossas vidas? Não é aquela mesma, olhos lânguidos e semblante roto, que balbucia nas janelas do nossos carros?
Claro que é. Mas, para além do “e-mail do ano”, para aquém do monitor da vida real, todos passam despercebidos: a criança, os enfermos prostrados nas filas dos hospitais públicos, os sem-teto que se alastram nas calçadas, todos estes que fingimos desconectados do nosso mundo, mas que são essência da nossa essência. E agora eles finalmente vêm a público, graças ao “e-mail do ano”, para nos mostrar como somos “privilegiados”, para nos acomodar?
Neste exato momento, imagino quantos e quantos acessaram o "e-mail do ano" em seus laptops, em suas coberturas, em suas varandas com vistas para o mar, e, após segundos de dó, agradeceram à vida, assim como agradecem as famílias, mesa posta, por terem o alimento que os outros não têm. Imagino e choro sangue...
Egoistas! A humanidade que me resta ainda me faz remoer a dor, a fome, o frio do meu semelhante. Me faz culpado e inerte. E se pensam, pois, que eu irei agradecer por poder pagar um plano de saúde enquanto muitos de mim não têm sequer como comprar um medicamento, se enganam; se vislumbram minha gratidão por sustentar um quarto alugado, ao passo em que muitos de mim fazem das marquises, abrigos, se enganam, redondamente. Jamais admitirei acostumar-me à miséria alheia, e muito menos farei dela torpor das minhas angústias, paliativo para os meus quereres.
Por isso, peço que, no ano que vem, não mais me repassem o "e-mail do ano". Aliás, nem no ano que vem, nem nos próximos.
“A morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procure saber por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”. John Donne, poeta inglês do século XVI.
Comentários
Há um tempão atrás, escrevi em meu blog um texto que mostrava essa cegueira das pessoas em relação a essas questões sociais, puxando mais para a politicagem a respeito desta questão, dê uma lida depois de ainda não viu!
http://jornaldobarbosa.blogspot.com/2007/01/e-aconteceu-em-patiobinha-do-norte.html
Viva la hinchada Carbonera !
O PRESIDENTE
eu ein.